Clube da Literatura e Saúde

Clube da Literatura e Saúde: A Arte da Imperfeição

By 21 de junho de 2019 No Comments

Aceitar-se como se é abre portas para aceitar o outro

 

O livro A Arte da Imperfeição é um daqueles livros libertadores. Explico: é aquele livro que parece ser mais do mesmo sobre auto-ajuda mas que, página após página, desconstrói essa premissa e vai muito além, fazendo-nos ter diversos insights e aquela agonia de nos vermos descritos no texto. Ele nos leva a entender os porquês de uma tendência do ser humano – aparentemente banal e geralmente coletiva -, que quase sempre nos leva ao sofrimento emocional e tristeza: forçar ser quem pensamos que devemos ser.

Como seres coletivos que somos, queremos ser aceitos e sentir o encantador gosto do pertencimento, nem que para isso tenhamos que pagar um bilhete “baratinho, baratinho”: esconder o que achamos que fazemos errado. Por algum tempo, os ganhos afetivos de achar que fazemos parte de algo maior compensam a sensação incômoda que começa a aparecer. No entanto, o precinho baixo começa a se acumular e avoluma-se em um alto preço a pagar quando o sabor amargo da dissimulação e do distanciamento de quem realmente somos passa a ser constante, diário e impossível de manter-se com um mínimo de sanidade mental. Com base em uma pesquisa de 10 anos, a autora Brené Brown, Ph.D., Assistente Social, Escritora, Pesquisadora e Professora na Universidade de Houston nos faz ver os malefícios de nos ajustamos ao outro e ao que nós pensamos sobre o-que-ele-vai-pensar-de-mim, seja uma pessoa ou um grupo. Dessa forma, apagando-nos a cada concessão, moldando-nos conforme as regras sociais, vamos nos distanciando de quem somos e o que de fato viemos fazer aqui nesse mundo. Nesse caso, o pertencimento claramente não ocorre, mas sim uma tentativa de ajuste ao grupo que, como a autora bem explica, não oferece nem de longe a conexão e felicidade que a sensação de pertencer ocasiona.

Voltando para o livro, a autora explica que teve um “Despertar Espiritual” após um colapso emocional, o que me levou a pensar que podemos sempre fazer-nos valer de um aparente problema e transformá-lo em uma oportunidade de crescimento. Assim, Brené nos presenteia com uma análise de diversos sentimentos e como eles – juntos – nos impedem de ter uma vida plena – de felicidade, de auto-estima e, principalmente, de conexão com os outros. Que não é fácil ir contra a maré quando temos alguma postura, objetivos, vocação, orientação sexual ou jeito de ser ditos “não-convencionais” todos sabemos. No entanto, com muita elegância e competência, a autora nos leva a ver que, nem por um minuto, anular-se – mesmo que parcialmente – vale a pena.

Após nos mostrar tudo isso, Brené nos apresenta 10 orientadores, todos feitos com o propósito de se chegar a uma vida plena, repletos de exemplos de ações para termos atitudes que possam nos levar cada vez mais perto da autenticidade de sermos nós mesmos, sem neuras, vergonha e sem nos paralisarmos frente ao medo de sentir-nos esquecidos ou até marginalizados. Ela coloca, com muita delicadeza, que a “minha história é importante porque eu sou importante” e, justamente por isso, não deveríamos aceitar nos ajustarmos ao meio social, mas sim, oferecer ao outro o nosso eu autêntico embalado em autoaceitação, para assim, de fato, conseguirmos pertencer a algo. Essa frase, se compreendida, pode nos ajudar a entender que, se alguém não nos aceita como somos, esse problema não é nosso, é do outro. É óbvio que isso não quer dizer que mudar não é importante, na verdade é essencial; no entanto, a autoaceitação e a ajuda do outro pode nos ajudar a ver pontos nevrálgicos que nos atrapalham ou ferem outra pessoa.

Então, mais uma reflexão que fiz, a partir do livro, é que, quanto mais conectados ao nosso ser inato, mais conexões conseguiremos fazer com os outros e mais forte será nossa aceitação a quem é diferente de nós, pois sabemos o quão difícil é assumir quem somos de fato. Esse é um ato de coragem tão grande que, por si só, consegue estabelecer bases para uma forte conexão com o outro e cria uma sintonia que dificilmente será quebrada.

Muitas passagens do livro merecem destaque, só que uma fez tanto sentido para mim que vale a pena trazê-la: “Amar e aceitar a nós mesmos são os atos definitivos de coragem. Em uma sociedade que diz “ponha seus interesses em último lugar”, amor-próprio e autoaceitação são quase revolucionários.”

Sejamos revolucionários então.

 

Dra. Fabiana Carvalho
Gestão do Conhecimento

Fisioterapeuta graduada pelo Centro Universitário Metodista do Sul; Doutorado em Medicina pela UFRGS; Mestre em Reabilitação e Inclusão pelo Centro Universitário Metodista do Sul; Especialização Lato Sensu no Tratamento da Dor e Medicina Paliativa na Fundação Universitária para o Estudo da Dor e Cuidados Paliativos UFRGS/HCPA; Pós-graduada em Acupuntura pela Faculdade de Ciências da Saúde de SP; Tem experiência clínica e de pesquisa na área de Tratamento da Dor Crônica, Neuromodulação (tDCS e TMS), Cronobiologia e Acupuntura; É docente desde 2005 em cursos de Graduação, Extensão e Pós-Graduação.

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